Enquanto na praça central de Lugansk os aviões de guerra do exército ucraniano matavam aos civis com os cohetes não dirigidos (confirmado pela OSCE), no Centro Sakharov de Moscou [1] foi realizada a conferência "Maidan ou Horda?" [2], onde os liberais, nacionalistas e certos islamitas russos aplaudiram os crimes de guerra de Kiev.
Conforme a estrela principal do ”aquelarre”, escritor Alexei Shiropaev (nacionalista étnico, torcedor do colaboracionismo de Andrei Vlásov [3]) a verdadeira Rússia é a Ucrânia atual, quando a Rússia atual é só um usurpador do nome orgulhoso "Rus’".
A Rus’ do Nordeste, já na etapa de mudança de sua capital de Kiev para Vladímir caiu para fora da tradição "democrática" de Kiev-Novgorod. Para Alexei Shiropaev o primeiro tsar autocrata da Rus’ de Nordoste Andrei, que ama a Deus, rompendo com o parlamentarismo oligárquico de Kiev e Novgorod, virou também o primeiro mongol-judeo-bolchevique antes dos mongóis e antes dos "judeo-comunistas" [4].
"Andrei, que ama a Deus é o primeiro inimigo do Maidan", - proclama Alexei Shiropaev. Se os radicais neonazistas bramam em Odessa depois de ter queimado vivos quase 100 ativistas pró-Rússia: "Putin é piroca!", Alexei Shiropaev lhes apoia desde o Centro Sakharov de Moscou: "Já Andrei, que ama a Deus também foi o mesmo piroca!"
A "Horda" para os nacionalistas, neonazistas, liberais e esquerdistas é o estatismo da Rus’ de Vladimir, cimentado no período dos mongóis, que perdura na Rússia até hoje.
"O tsarismo de Moscou é uma mutação monstruosa da Rus’ de Kiev, que conduziu à perda total das qualidades originais", - disse Alexei Shiropaev. - Quando "Maidan" é um teste universal da russidade".
Não comentamos aqui que a mesma palavra "Maidan" é de origem árabe, igual que os penteados e uniformes teatrais dos cossacos travestis de Maidan de hoje [5], que se supõe que são os verdadeiros russos, foram copiados das modas da Turquia medieval.
Alexei Shiropaev é um falsificador banal da história, narrador de contos de fadas para os skinheads. Já escrevemos antes, como os nacionalistas étnicos russos sonham com o status do protetorado oficial dos EUA ou pelo menos um estado nacional tipo República Tcheca ou a Estônia [6].
"A Rússia <Horda> é nosso inimigo, a isso se reduz todo nosso programa político", - expressou o credo dos liberais e etno-nacionalistas o filosofo Mikhail Verbitski.
Ideologema de "Horda"
A palavra "Horda" está carregada negativamente tanto para a maioria dos russófilos como para os russófobos. Conforme ao dicionário online de português: "horda" significa: 1) tribo tártara, 2) povo nômade, 3) bando de pessoas indisciplinadas, de malfeitores". No discurso científico "horda" é "arcaização e regresso, ocupação e saque, etc."
A invasão do fascismo pan-europeu no tempo da Grande Guerra Patriótica na retórica soviética foi comparada com a ocupação das hordas dos mongóis.
Mas os fascistas também demonizavam aos russos, incriminando-lhes a maldição do sangue mongol. Alfred Rosenberg, ideólogo principal do nacional-socialismo alemão, expõe em sua obra "O Mito do Século XX" esta ideologema de "Horda": "Outrora a Rússia foi fundada pelos vikings, elementos germânicos erradicaram o caos da estepe russa e pressionaram aos habitantes dentro de formas estatais possibilitadoras de cultura [7]. Este rol do sangue viking em extinção o retomaram mais tarde as Hansas alemães e em geral os imigrantes ocidentais à Rússia; na época desde Pedro o Grande os bálticos alemães, para o inicio do século XX - os povos bálticos, também fortemente germanizados [8]. Mas baixo a camada superior portadora da cultura na Rússia sempre cochilava a ânsia por uma ilimitada expansão, a vontade impetuosa de pisotear todas as formas de vida, sentidas como simples barreiras. O sangue misturado com o mongol entrava em ebulição em todos os choques da vida russa, mesmo em forte diluição, e arrastava aos homens a ações que ao próprio indivíduo, muitas vezes lhe tenham parecido incompreensíveis. Esta inversão repentina de todos os sinais éticos e sociais que retomam continuamente na vida russa e na literatura russa (de Chaadaiev a Dostoievski e Gorki) são uma indicação de que as correntes sanguíneas inimigas lutam umas contra outras e que essa luta não vai acabar antes de que uma força de sangue triunfe sobre a outra. O bolchevismo significa a rebelião do mongolóide contra as formas culturais nórdicas, é o desejo pela estepe, é o ódio do nômade contra a raiz da personalidade,significa a tentativa de livrar-se da Europa em si.
A raça báltica-oriental, dotada de muitos dons poéticos, resulta - ao estar impregnada do sangue mongol - barro, dúctil nas mãos dos condutores nórdicos ou de tiranos judeus e mongóis. Ela canta e dança, mas assassina e solta sua fúria ao mesmo tempo; é devotamente fiel, mas quebrando em formas relaxadas, desenfreadamente traiçoeira. Até que é forçada dentro de novas formas, embora sejam da natureza tirânica".
Os nazistas em sua propaganda eram muito mais claros do que seus discípulos liberais de hoje. A Ucrânia (Maidan) "canta e dança", enquanto a Rússia (Horda) "assassina e solta sua fúria, livrando-se da Europa em si".
Os fascistas não eram os pioneiros, culpando à Rússia no asiatismo hordáico: os paralelos semelhantes são uma ideia fixe da russofobia europeia: em qualquer de suas variantes, seja o tsarismo de Ivã o Temível, o império de Pedro o Grande, a URSS de Iosif Stalin, a Rússia sempre fica a sucessora da Horda de Ouro, doente cronicamente de "asiatismo".
Com isso a Horda de Ouro é um conceito convencional, um clichê ideológico, que geralmente significa uma inversão absoluta do Ocidente.
Por exemplo, para os liberais de hoje, a Rússia atual, a URSS, o império dos Romanov, o tsarismo de Moscou são a Horda de Ouro, pela falta de paradas gay, ou seja pela falta de assim chamada sociedade civil e o mercado. Quando "as instituições de Horda" estão enraizados muito profundo: a supremacia da propriedade estatal, a imobilidade do poder, o coletivismo, etc.
Conforme aos etno-nacionalistas na Rússia de hoje igual que na época de Horda de Ouro os grupos de oligarcas locais oprimem o povo russo com apoio das máfias étnicas dos chechenos, dagestanêses, tártaros, etc. Igual que na URSS os grupos internacionais oprimiam aos russos com apoio das elites asiáticas e judaicas. Igual que antes da URSS os Romanov oprimiam aos russos com apoio dos castigadores-cossacos e funcionários alemães e antes dos Romanov, os tsares russos oprimiam aos russos com apoio dos mongóis.
A demonização da "horda" pelos russófobos estrangeiros e os liberais e etno-nacionalistas russos leva ao fenómeno de que aparecem os ideólogos que até negam o fato histórico do jugo dos mongóis ou vem nele somente o lado positivo (os euroasistas de Alexandr Dugin até chegam ao culto do barão sádico Ungern von Sternberg [9])
"Horda" de fato
Sem dúvidas o período da invasão mongol foi um período da ocupação, mas os mongóis não realizaram na Rússia um genocídio como na China. Ao mesmo tempo o Império Mongol não somente passou à Rússia suas superavançadas tecnologias de guerra, mas também os mongóis trouxeram para a Rússia a cultura estadista da conquistada por eles China: centralização, a severa disciplina dos funcionários, destruição da influência de nobreza tribal, meritocracia, pagamento de impostos através da responsabilidade mútua, etc. A administração na Rússia no período da Horda de Oura estava na altura, que seria possível na Europa somente no tempo de Napoleão. A China nesse tempo tem superioridade cultural absoluta sobre Europa: é importante que eram os europeus que sempre procuravam conquistar o Leste, enquanto as civilizações do Leste não tinham muitas ganas de ir para Europa.
Repetimos que a Horda virou o condutor da modernização chinesa da Rússia. Nesse período a Rússia apreende as tecnologias chinesas de fundição de ferro, de produção de pólvora, de uso do arado chinês, etc. Copiamos a roupa chinesa (o famoso gorro "ushanka" e botas de feltro), técnicas decorativas, construção de casas com armações, etc. Da China foi trazido para a Rússia o ábaco, que vai migrar da Rússia para Europa só uns século mais tarde.
Ao mesmo tempo a conquista da Rússia provocava uma constante resistência e para o século XIV já eram os russos que administravam os impostos no país e não os mongóis como na primeira etapa da conquista. Reconhecendo o poder dos mongóis os russos recuperaram o país e superaram a Horda de Ouro.
Por certo a cultura persa também veio a Rússia no contexto da Horda de Ouro. Pérsia e China são grandes civilizações antigas, que superavam Europa em seu tempo, não se pode comparar o estado atual dos países asiáticos com seu estado na Idade Média - é a mesma coisa que comparar os italianos de hoje com os romanos do Império de Roma. Não temos que ver nada mal nas modernizações da Rússia ao estilo chinês e persa na época dos séculos XIII-XV. Além disso, não se pode reduzir a história da Rússia ao período de horda: na época de Ivã o Temível o país se orientou à experiência da Turquia, no período de Pedro o Grande copiamos a modernização da Holanda, Nikolai I copiava a experiência da Prússia, os soviéticos aceitaram muitos elementos da industrialização americana.
Ideologema de Maidan
Conforme o mito histórico de Maidan - os fronteiriços Novgorod e Kiev supostamente foram menos infectados pelo "asiatismo" e, portanto, eles conseguiram conservar sua "genética europeia" (normando-bizantina ou alemã, como lhe gostaria crer a Rosenberg) no maior grau. É por isso é que a Ucrânia não é a Rússia, quando a Rússia é um mutante sino-irano-mongol.
O herói principal desse ideologema é o príncipe Daniel Romanovich da Galícia (periferia ocidental da Rússia), que a diferencia do príncipe de Vladímir (o centro da Rússia) Alexandr Nevsky desafiou a Horda de Ouro e no resultado como creem os neonazistas ucranianos e seus simpatizantes Daniel Romanovich conservasse melhor a "verdadeira russidade". Essa "verdadeira russidade" se manifestou na traição de hetman Ivã Mazepa a Pedro o Grande, na resistência branca, pagada pelos alemães, aos bolcheviques, no colaboracionismo de Stefan Bandera com os nazistas alemães e na orientação atual de Kiev para a UE.
Maidan de fato
É verdade que ao contrário de Alexander Nevski, Daniel Romanovich tinha uma posição geopolítica muito mais favorável e podia opor certa resistência à Horda de Ouro. Mas como é bem conhecido, sua resistência ficou sem sentido na prática: ao final das contas Daniel Romanovich foi subordinado pelo general mongol Burundai. Não lhe ajudou a coroa recebida de mãos do Papa de Roma, quando o dano sofrido pelo território da Galícia-Volínia foi significativamente maior do que o dano sofrido pela Rus’ do Nordeste (de Vladimir). Com isso o principado de Galicia-Volínia perdeu sua independência, dissolvido na Lituânia e Polônia, continuando pagar o tributo à Horda de Ouro e mais tarde ao Khanato de Crimeia.
No resultado da aventura de Daniel Romanovich seu prinicipado perdeu a identidade russa (aceitando o catolicismo), perdeu a independência e desapareceu para sempre da história. Quando no resultado da política de Alexandr Nevski a Rus’ de Vladímir superou a Horda de Ouro e se transformou na Rus’ de Moscou. Por que Alexandr Nevskiï não passou pelo caminho de Daniel Romanovich? Porque depois da batalha no rio Neva ele entendia que o "Ocidente" no plano militar não era um aliado sério, quando as consequências de sua ajuda temporal poderiam ser destrutivas para a Rússia. Como sabemos hoje ele tinha toda a razão.
Por causa da aventura de Daniel Romanovich as periferias do Sul da Rússia viraram um polígono milenário para as inteligências ocidentais, lutando contra a Rússia. Heróis de Maidan é um panóptico dos traidores, que até se nos supomos que tenham algum sono de independência, na realidade sempre vendem seu povo à Polônia com Lituânia (Daniel Romanovich), ou à Polônia com Suécia (hetman Ivã Mazepa), ou à Alemanha (Stefan Bandera), ou aos EUA, como a elite atual da Ucrânia.
O projeto pós-soviético da nação ucraniana não tem nenhum programa positivo e se constrói só sobre a negação da "russidade", na realidade sobre a russofobia. Os russos não sentiram nada salvo a piedade aos radicais ucranianos, fanatizados pelo mito de Maidan.
A pergunta "Maidan ou Horda" não é correta, a pergunta é "Europa e sua encarnação mais radical - EUA ou a Rússia", desaparecimento ou conservação histórica.
5. a mesma palavra "cossaco" é de origem tártara, igual que o famoso grito "hurrá" dos militares russos. Os primeiros cossacos eram os tártaros que passaram para o lado dos russos e serviam de guardas de fronteiras. Esse termo nunca teve na Rússia uma conotação étnica, os cossacos eram um estrato social: ao abandonar o serviço de guarda de fronteira (nas "ucrânias" (periferias) da Rússia no Sul (a Ucrânia atual) ou nas "ucrânias" da Rússia do Leste (o Cazaquistão atual) os cossacos deixavam de ser os cossacos).
7. É uma visão ultra simplista, olhem o contexto do inicio da Rússia:
8. O próprio Rosenberg era cidadão do Império Russo, nasceu em Reval (Tallinn), na atual Estônia, que era parte do Império Russo naquele tempo.