A revolução será sim televisionada! O Lênin é interpretado por Leo Di Caprio, ouviu! O autor do roteiro é Gene Sharp, caramba!
Pelo menos no famoso estúdio de cine russo Lenfilm (Len - de Lênin) não há dúvidas de que tal filme sobre Lênin Di Caprio será um grande sucesso. A revolução é um tema sério, "a coisa tá russa"! Só os russos de hoje não valorizam sua história do século XX... Não foi a Lenfilm que se lembrou de Lênin, senão um playboy de Hollywood.
E o filme sobre Lênin, um ícone da revolução, é oportuno como nunca. O núcleo do sistema-mundo está em crise: as potências grandes brigam pelos mercados esgotados (aqui entre os intelectuais volta à moda Karl Marx & Co), enquanto as periferias do mundo são formatadas conforme as novas rotas de comércio, desenhadas desde o centro (os intelectuais "periféricos" sempre andam atrasados, vestidos de "conservadores", optando pelos filósofos de direita - o "second hand" europeu).
A Rússia, mãe da Revolução, virou contra-revolucionaria
Se o núcleo do mundo sofre de uma crise de identidade, a hegemonia dos EUA esta na bancarrota (com frecuência estas crises se tornam grandes guerras), as periferias sofrem das "ondas revolucionárias", que já destruíram o espaço post soviético ("revoluções coloridas"), sacudiram o mundo árabe ("primavera árabe"), e elas já estão atingindo a Rússia, penetrando a Ásia, aproximando-se dà China.
A revolução é vista hoje como um simples “regime change”. Os “revolucionários” de hoje já não querem mudar o mundo, senão se adaptar ao mundo finalizado conforme padrões dos EUA. Os países “párias” que desafiam estes padrões são xingados como contra-revolucionários.
Como um dos obstáculos principais para a hegemonia dos EUA foi abertamente qualificada a Rússia (que honra!). O Ocidente declarou uma guerra híbrida à Russia de Putin, provocando um cisma entre as elites russas e deslegitimando o grupo governante de Putin. Para empurrar a Rússia à uma revolução, a Ucrânia é afogada numa guerra civil.
Não é de surpreender que nos últimos anos o imaginário coletivo dos russos viva uma nova revisão da história da Revolução Russa de 1905-1917. Não é a primeira vez e esperamos que não seja a última.
Abaixo, à grosso modo, vamos apresentar a interpretação da Revolução Russa de 1905-1917 segundo o atual grupo governante da Rússia e seus intelectuais cortesões:
1) A Revolução de 1905-1917 na Rússia foi um Maidan, um teatralizado “regime change”, orquestrado desde estrangeiro. Como o Maidan foi só um elo da cadeia dos golpes de estados no espaço post-soviético, a Revolução Russa de 1905-1917 também foi só um dos elementos da “onda revolucionaria” do inicio do século XX (Rússia, Império Otomano, México, China).
É impressionante como certas recreações da Revolução Russa pelo cinema soviético pintem o Maidan de hoje!
2) Os beneficiários da Revolução Russa de 1905 e de Fevereiro de 1917 foram, antes de tudo, os anglosaxões e japoneses.
As reuniões dos radicais russos do inicio do século XX se passavam em Londres e Zurique. E os radicais de hoje preferem quase as mesmas cidades: ex-oligarca Jodorkovski mora na Suiza e ex-oligarca Berezovski morou em Lóndres.
Sem dúvida os opositores receberam o dinheiro do Japão para a Revolução de 1905 (no contexto da guerra entre a Rússia e o Japão). Hoje estão ativados os mesmos enredos geopolíticos:
3) as tecnologias da mobilização revolucionaria também não mudaram muito desde 1905 (a Revolução Russa de 1905, por sua vez, foi uma copia perfeita das revoluções europeias de 1848). Gene Sharp não descobriu nada novo:
- as greves dos setores de infraestrutura para paralizar a vida normal nas cidades mais importantes
- as campanhas de banquetes para a imprensa liberal com fim de radicalizar a opinião pública
- mobilização dos estudantes para as manifestações não violentas (entre aspas), que geralmente se tornam os crueis enfrentamentos com a policia (provocados pelos radicais, infiltrados entre a molecada de estudantes).
- boicote dos intelectuais conservadores, etc.
Tudo que serve para radicalizar o povo, cismar as elites e deslegitimar o grupo governante.
Lev Tolstoi, Máximo Gorki, Vladímir Mayakovski, Vladímir Korolenko, etc. foram um coletivo Pussy Riot do inicio do século XX (sim, vivemos uma terrível degradação, mas ao mesmo tempo devemos reconhecer que hoje a oposição russa no campo cultural não é apresentada somente pelas mediocres Pussy Riot, mas também tem escritores importantes como E.Limonov (nacional-bolchevique), V.Sorókin (liberal), etc. Simplesmente, Pussy Riot são mais convenientes para a promoção. Não nos esqueçamos do último Premio Nobel por literatura do ano 2015).
4) as elites opositoras são uma chave da revolução. É sabido que depois da revolução de Fevereiro de 1917 (quando ganhou o governo provisório formado pelos masons anglófilos) o primo do czar Nikolai II - grande príncipe Kirill até põe um laço vermelho. Foram os “caras” mais próximos ao czar que o fizeram abdicar do trono russo.
Claro, que as elites eram liberais, mas até entre elas havia também personagens radicais: por exemplo, a organizadora do atentado contra o czar Alexandr II em 1881 foi Sofia Peróvskaya, uma filha do governador de São Petersburgo! Ela não precisava de dinheiro. A diferença de Alexandr Ulianov, irmão de V.Lênin: Alexandr teve que vender sua medalha de ouro (era um estudante brilhante) para comprar os componentes da bomba, endereçada ao czar Alexandr III.
Queremos dizer que não há nada surpreendente que a afilhada do presidente V.Putin Ksenia Sobchak fosse uma dos glamour-comandantes das revoltas em Moscou em 2012 (K.Sobchak é filha do prefeito liberal e odioso de São Petersburgo Anatolli Sobchak, V.Putin trabalhou nessa prefeitura nos anos 90, muito amigo de A.Sobchak).
5) os revolucionários sonham com uma revolução, e as revoluções acontecem nos momentos da perda da legitimidade por grupo governante. É ridículo falar da ilegitimidade das revoluções. Claro que as revoluções sempre são ilegítimas! Como os governos desafiados por revoluções sempre são os governos que têm pouca legitimidade.
E os revolucionários costumam argumentar com violência brutal (quando o governo já perdeu seu monopólio sobre o uso da força). Um dos mems do Maidan - combatente brutal do braço militar de Pravi Sektor Sashkó Bily é parecido com o marinheiro-anarquista Zhelezniak quem dissolveu com as armas a Assembleia Constituinte Russa em janeiro de 1918. Assim que os radicais russos: bolcheviques e socialistas revolucionários de esquerda conseguiram monopolizar o poder (isso não aconteceu na Ucrânia, onde os radicais são uma clássica bucha de canhão, manipulada pelos liberais).
Sim, os bolcheviques subiram ao poder por meio de um golpe (contra o Governo Provisório do capital estrangeiro).
Sim, os bolcheviques eram muito radicais, o que em parte foi uma das causas da guerra civil (não a principal): por exemplo, os bolcheviques igualizaram um voto de operário a 5 votos de camponeses.
Sim, aos bolcheviques não lhes importava a “legitimidade”.
7) Como as massas não por todas partes costumam apoiar os revolucionários é frecuente o uso dos mercenários (o que não é decisivo). Igual ao Maidan Ucraniano, segundo alguns historiadores a Revolução Russa também teve este episódio: se trata da participação no Exército Vermelho de chineses (húngaros e letôneos tiveram antes de tudo os motivos ideológicos).
Podemos continuar estes paralelos entre a Revolução Russa de 1905-1917 e o Madian da Ucrânia. Estes paralelos são possíveis iguais aos paralelos entre Israel e o Terceiro Reich.
E na Rússia é bastante comum ouvir falar desses paralelos ao presidente V.Putin, ministro da cultura V.Medínski, vice-presidente do parlamento V.Zhirinóvski, escritor N.Stárikov (presidente do movimento “Anti-Maidan”), etc.
Achamos que, sem dúvida, existe fundamento para tais paralelos, mas não se pode ignorar a específica do golpe de Outubro de 1917:
Foi a primeira vez na história quando os radicais (“marionetas”) conseguiram interceptar o poder de liberais e de seus padrinhos estrangeiros (“marionetistas”). Os bolcheviques restauraram o império russo numa forma mais moderna e muito mais justa, além disso eles conseguiram fazer seu modelo atrativo para uma significante parte do mundo.
Como disse o tio do czar Nikolai II: “Sem dúvidas eles mataram três dos meus irmãos, mas eles também salvaram a Rússia do destino de um vassalo dos aliados”.
Para sobreviver Putin deve virar bolchevique
Сada nova situação tem sua específica. A Rússia hoje não é um país de camponeses, a motivação do povo já não é tão simples como antes. Demograficamente a Rússia não sofre pressão de “уouth bulge”, como em 1905-1917. Ao mesmo tempo a geopolítica e as ferramentas de dominio não mudaram muito. É engraçado que o mesmo Putin & Co para defender sua subjetividade histórica tem que atuar justo como bolcheviques:
Os bolcheviques recusaram de pagar as dívidas do czar aos bancos estrangeiros (um dos motivos da intervenção militar da Inglaterra e França na guerra civil russa). Putin, hoje, também não quer pagar as “indemnizações” aos “inversionistas” de Yukos.
Os bolcheviques prenderam os nacionalismos étnicos oferecendo um modelo de autogestão no marco da União das RSS e antes de tudo apresentando a justiça econômico-social, satisfatória para a maioria dos camponeses multiétnicos. Putin faz a mesma coisa, desenhando a União EuroAsiana. Só o “pragmatismo econômico” de seu grupo governante é bastante hipócrita e pouco atrativo para um homem pequeno.
Os bolcheviques tiveram o problema da luta dentro do partido entre os estalinistas realistas (social-localistas) e os trotskistas fanáticos (social-globalistas). Parece que Putin também sofre desta forma de esquizofrenia dentro de seu grupo governante (estadistas-patriotas vs liberais-globalistas).
O drama da situação atual é o mutismo intelectual de Putin (apesar de sua charlataneria), é um drama de ausência da linguagem vanguardista para se explicar com confiança a seu próprio povo e aos simpatizantes estrangeiros.
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Tanto Marx como Engels afirmavam que o socialismo seria a etapa superior do desenvolvimento da sociedade socialista e cabia a burguesia revolucionar o desenvolvimento das forças produtivas. Cabia a burguesia promover a revolução democrático burguesa e a revolução industrial. Agora transição pacífica para o socialismo nunca encontrei texto na literatura marxista que levasse a esse entendimento e, ao contrário, Marx se opôs a ideia de um levante contra a burguesia na França porque temia pela derrota do movimento e quqndo ocorreu o levante,comuna de Paris, elogiou a energia das massas no dizer de Lênin. Agora a afirmação de que a Rússia Czarista não possuia classes sociais e só estamentos é estranha. até porque a soiedade servil tinha sido abolida com a liberação dos camponeses.
ОтветитьУдалитьobrigado pelo comentário.
УдалитьVocê está com razão: segundo o Marx (o Manifesto e o Capital) cabia a burguesia promover a revolução. No caso da Rússia nesta lógica a revolução deveria parar no Fevereiro de 1917. É por isso que havia tanta oposição entre os bolcheviques contra a ideia de Lenin de fazer um golpe contra o governo provisório da burguesia (impossível em 7 meses desenvolver o capitalismo num país periférico, esgotado pela IGM). Kamenev e Zinoviev abertamente na imprensa nacional avisaram seu desacordo e denunciaram o plano de Lenin de fazer um golpe (ou seja os planos golpistas de Lenin não foram segredo nenhum na Rússia de 1917).
Neste sentido a revolução de Lenin foi antimarxista e sim foi populista (no sentido russo desta palavra: a ideia dos populistas russos foi pular a fase “marxista” do capitalismo e passar direito ao socialismo, com base da comunidade dos camponeses, a coisa quase única, que não se encaixava nos esquemas marxistas ortodoxos).
Marx mesmo começou a duvidar quanto a seu esquematismo imediatamente depois do fracasso da comuna de Paris. Marx não era tão simples como Engels. Marx até mudou alguns trechos nas edições novas do Capital e revisou sua crítica dos populistas russos (primeiro ele se burlou de Alexander Herzen e depois valorizou muito Nikolai Tchernichevski).
Sugiro o livro de Teodor Shanin “Late Marx and the Russian Road” e antes de tudo o artigo de Haruki Wada “Marx and Revolutionary Russia”.
Marx até enviou algumas cartas para os marxistas russos, criticando sua ortodoxia. E os marxistas russos censuraram estas cartas de Marx!
Marx admitiu a importância da comunidade. Acho que podemos supor, que a comunidade russa se encaixou com sua ideia de modo asiatico da produção (sem divisão nas classes do jeito ocidental). A sociedade servil foi abolida na Rússia czarista de 1861 só de jeito formal, de fato a questão da terra ficou resolvida só com a Revolução de Outubro. Eu intentei explicar isso no meu filme: “Escravos: negros no Brasil, brancos na Rússia”: https://youtu.be/iDGpW31QZSc
A sociedade brasileira e russa tem pontos de contatos: é por isso que a telenovela "Irmãos coragem", uma adptacão do romance " Os irmãos Karamazov" está entre um dos maiores sucessos da TV brasileira. As duas sociedades são sentimentais, passionais e entre o elitismo de cunho autoritário marcou nossa história e o vício do verbalismo do discurso político levou ao apogeu a literatura e da poesia. A literatura aponta muitos de nossos vícios culturais. Machado de Assis escreve o livro " Memórias Póstumas de Brás Cubas", um integrante da classe média alta que narra os amores vividos e a vida ociosa que levava: não ficava bem para uma pessoa bem nascida exercer atividade que exigia trabalho manual e sobrava o estado para dar emprego a apaniguados de classes superiores. O Brasil aboliu o escravagismo no final do século XIX e a Rússia Czarista da servidão quase em meados dos do século XIX. Um companheiro do PCB afirmou que "a burguesia russa não tinha solução para os problemas da Rússia e perdeu as rédeas do poder". E é verdade porque Kerensky e os esseristas chegaram ao poder com promessas de introduzir reformas sociais na sociedade russa e não fizeram nada e ainda insistiram para que a Rússia se mantivesse na primeira guerra mundiale a revolução socialista foi o único caminho que sobrou para seguir. Já análises até de historiadores, que não são comunistas, honestos, e que tem a mesma opinião.
ОтветитьУдалитьTem muita gente, entre nós, que não tem um conhecimento bom da história russa e acredita que as repúblicas populares são necessariamente de partido único e o que não é verdade. Na República Democrática Alemão (RDA) tinha dois partidos no poder e a Hungria tinha três. Foia contingência histórica que levou a URSS ater um partido único porque ocorreu um racha entre bolchevistas e esseristas. O compromisso histórico dos comunistas continua sendo eliminar o individualismo burguês e isso significa eliminar as classes sociais e daí o termo ditadura do proletariado. Portanto, comunismo e nazifascismo não tem nada a ver. No nazifascismo o partido não é só único na teoria, o estado é corporativista e é a burguesia que está no poder exercendo sua ditadura. Aliás, qual o partido socialista que existe nos EUA ?. E se existe, como ele vai disputar pleitos eleitorais com os dois grandes partidos políticos da aristocracia da burguesia americana ?.
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