Alexandr Mijáilovich, neto do czar Nicolai I e tio do czar Nicolai II (também foi marido da irmã de Nicolai II), chefe da Direcção da Flota Comercial do Imprio Russo nos anos 1902-1905:
"Ocorreu-me que embora eu não fosse um bolchevique, mas eu não podia concordar com meus parentes e conhecidos e de forma imprudente condenar tudo o que os Soviets fazem, só porque isso é feito pelos Soviets. Sem dúvidas eles mataram três dos meus irmãos, mas eles também salvaram a Rússia do destino de um vassalo dos aliados.
O tempo, quando eu os odiava e tinha muitas ganas de chegar até Lenin ou Trotskiï, passou, porque eu comecei obter as notícias sobre um e depois sobre outro passo construtivo do governo de Moscou e encontrei-me com o fato de que eu sussurrava: "Bravo!".
Como todos os cristãos que "não são frios nem quentes" eu não conhecia outra forma de remediar o ódio, como inundá-lo em outro ódio, ainda mais ardente. Os polacos me ofereceram um objetivo conforme última opção.
Quando no início da primavera de 1920 vi as manchetes dos jornais franceses, anunciando uma procissão triunfante de Pilsudski sobre os campos de trigo da Maloróssia [1.], algo fraturou dentro de mim e eu esqueci sobre o fuzilamento de meus irmãos, ocorrido faz um ano. A única coisa que passava por minha cabeça foi: "Os polacos estão prestes a tomar Kiev! Eternos inimigos estão prestes a cortar as fronteiras ocidentais do Império Russo". Eu não ousei me expressar abertamente, mas ouvindo as conversas absurdas dos refugiados e olhando para seus rostos, eu desejava com toda a minha alma a vitória do Exército Vermelho.
Não importa que eu era o Grão-Duque. Eu era um oficial russo, que deu juramento para defender a Pátria de seus inimigos [2.]. Eu era o neto do homem que ameaçou arar as ruas de Varsóvia, se os polacos uma vez mais se atrevessem a quebrar a unidade de seu império. De repente, ocorreu-me uma frase desse antepassado meu, uma frase de 72 anos atrás. Direito no informe sobre os "atos ultrajantes" do ex-oficial russo de artilharia Bakunin [3.], que levou a multidão dos revolucionários alemães na Saxônia para assaltar a fortaleza, o Imperador Nicolau I escreveu com letras grandes: "Hurra a nossos artilheiros"!
A semelhança da minha e sua reação me surpreendeu. Eu senti a mesma coisa quando o comandante vermelho Budionny derrotou as legiões de Pilsudski e perseguiu-o até Varsóvia. Desta vez os elogios foram dirigidos para os cavaleiros russos, mas no resto poucas coisas mudaram desde os tempos do meu avô.
- Mas você parece esquecer - o meu fiel secretário disse - que, entre outras coisas, a vitória de Budionny significa o fim às esperanças do Exército Branco na Crimeia.
Sua observação razoável não abalou minhas crenças. Naquele verão inquieto do vigésimo ano ficou claro para mim, igual que é claro para mim agora no tranquilo ano de 1933, que para alcançar uma vitória decisiva sobre os polacos o governo soviético fez tudo o que era necessário fazer para um governo verdadeiramente popular. Parece irônico que os participantes da III Internacional tenham de proteger a unidade do Estado russo, mas a verdade é que desde aquele mesmo dia os soviéticos estão obrigados a realizar uma política puramente nacional, que não é outra coisa senão a política de muitos séculos, lançada por Ivã o Temível, desenhada por Pedro o Grande, que atingiu seu ponto culminante sob Nikolaiï I. Essa politica é defender as fronteiras do estado a qualquer preço e passo por passo avançar até as fronteiras naturais no Ocidente! Agora eu tenho certeza que até mesmo meus filhos vão ver o dia quando chegar o fim não só à independência absurda das repúblicas bálticas, mas quando a Bessarábia e Polônia também ser recuperadas pela Rússia e os cartógrafos terão que trabalhar duro sobre a redefinição das fronteiras no Extremo Oriente [4.].
Nos anos vinte eu não me atrevi a olhar para um futuro tão distante. Então eu estava preocupado com meu problema puramente pessoal. Eu vi que os soviéticos saiam de uma longa guerra civil como vencedores. Ouvi que eles cada vez falavam menos dos temas que ocupavam tanto a seus primeiros profetas nos dias tranquilos do "La Closerie des Lilas" [5.] e cada vez eles falavam mais dos temas que sempre foram vitais para o povo russo como um organismo unido. E eu perguntei a mim mesmo, com toda a seriedade, que você esperaria de um homem privado de sua propriedade significante e que testemunhou a liquidação da maior parte dos irmãos: "Se eu, como um produto do império, uma pessoa educada em crença na infalibilidade do Estado, se eu ainda posso condenar os atuais governantes da Rússia?”.
A minha resposta foi: "sim" e "não". O Senhor Alexander Romanov gritou "sim". O Grão-Duque Alexandre disse "não". O primeiro foi obviamente decepcionado. Ele adorava suas propriedades prósperas na Crimeia e no Cáucaso. Ele desejava entrar uma vez mais no escritório de seu palácio em São Petersburgo, onde os inúmeros estantes abarrotavam dos volumes encadernados em couro sobre a história da navegação e onde ele poderia preencher as noites com as aventuras, apreciando as antigas moedas gregas e rememorando esses anos que ele tinha passado em sua busca.
Felizmente para o Grão-Duque, ele sempre foi separado do senhor Romanov com uma face. Portador de um título muito alto, ele sabia que ele e sua turma não deveriam ter um conhecimento amplo ou exercer a imaginação e, portanto, no caso da resolução da dificuldade atual, ele não hesitou, porque simplesmente tinha que confiar em sua coleção de tradições, essencialmente banais, mas surpreendentemente eficaz para fazer soluções. Fidelidade à Patria. Exemplo dos antepassados. Conselhos dos iguais. Permanecer fiel à Rússia e seguir o exemplo dos Romanov, que nunca imaginavam-se mais do que seu império, significava aceitar que foi mister ajudar ao governo soviético, não obstaculizar seus experimentos e desejar sucesso naquilo em que os Romanov falharam".
Fonte:
http://www.ozon.ru/context/detail/id/128574/
1. Maloróssia significa em russo "Pequena Rússia", o nome carinhoso que se usava na Rússia para chamar aquelas terras que agora são conhecidas como a Ucrânia. "Pequena Rússia" quer dizer "coração da Rússia, o centro do mundo russo", quando a "Grande Rússia" era só uma periferia da Pequena Rússia. O nome "Ucrânia" foi dado a essas terras pelos polacos: "Ucrânia" quer dizer "margem, zona marginal, periferia" - assim com desdém os polacos chamavam esse território. Os russos mais tarde também usavam esse termo "Ucrânia", mas ele foi usado tanto para a "Rússia Pequena" como para o atual Cazaquistão.
2. Uns 30% dos oficiais que juravam fidelidade a Nicolai II depoís da Revolução Russa passararm para o lado do Exército Vermelho.
3. http://pt.wikipedia.org/wiki/Mikhail_Bakunin
4. Alexandr Mijáilovich teve razão e os acontecimentos esperados por ele ocurreram.
5. Lenin e Trotski gostavam de jogar xadres nesse cafe de Paris, também o cafe foi frecuentado por Paul Verlaine, Maurice Maeterlinck, Oscar Wilde, August Strindberg, Ernest Hemingway, etc.